Abre-se o caixa 2 das empresas de ônibus do Rio

04/07/2017 - O Globo

A corrupção no Rio se tornou sistêmica. Ao esquema envolvendo governo, empreiteiras, TCE e Assembleia Legislativa, juntam-se agora empresários de ônibus
   
A operação Ponto Final — desdobramento da Lava-Jato no Rio — é, na verdade, ponto de partida para se desvendar a caixa-preta das empresas de ônibus. Embora dominem amplamente o mercado fluminense — transportam cerca de 70% de todos os passageiros — e recebam R$ 28,3 milhões por mês em subsídios do governo do estado, elas nunca primaram pela transparência. Não por acaso, suspeitas de corrupção sempre rondaram o sistema. A chamada “caixinha” da Fetranspor (Federação das Empresas de Transporte do Rio de Janeiro), que abasteceria políticos em troca de vantagens para o setor, sempre foi negada pelos empresários, e quase virou lenda urbana, mas, agora, ganha nomes, endereços e CPFs. O esquema veio a público a partir da prisão do empresário Jacob Barata Filho, no Aeroporto Internacional Tom Jobim, na noite de domingo, quando tentava embarcar para Portugal.

O fio da meada começou a ser puxado com a delação premiada do doleiro Álvaro José Novis, encarregado pelos empresários de fazer os repasses. De acordo com as investigações do Ministério Público Federal (MPF), dos R$ 260 milhões pagos em propina pelas empresas de ônibus, R$ 122,9 milhões foram destinados ao ex-governador Sérgio Cabral, que está preso. Novis relatou que, embora as planilhas façam referência ao período de setembro de 2009 a janeiro de 2016, o esquema teria começado quando Cabral ainda era deputado estadual, antes de assumir como governador, em 2007.

Por determinação do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, foram presos, além de Jacob Barata Filho, o presidente da Fetranspor, Lélis Marcos Teixeira; o presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Rodoviário do Rio de Janeiro (Setrerj), Marcelo Traça Gonçalves; e o ex-presidente do Departamento de Transportes Rodoviários do Rio (Detro) Rogério Onofre. O órgão é encarregado de fiscalizar os ônibus intermunicipais.

Pelo que apurou a força-tarefa da Operação Calicute (versão da Lava-Jato no Rio), a propina saía da garagem das empresas em carro-forte e era guardada no cofre da própria transportadora de valores. O dinheiro pagaria favores como reajustes injustificados de tarifa, retenção de créditos do Riocard e relaxamento da fiscalização sobre linhas intermunicipais.

Entende-se agora por que o serviço de ônibus, de modo geral, deixa tanto a desejar, com frota envelhecida, veículos malconservados e horários intermitentes. Pelo jeito, não faltam recursos.

A Operação Ponto Final é mais uma evidência de que, tal qual no plano federal, a corrupção no Rio se tornou sistêmica. Ao esquema envolvendo governo, empreiteiras, Tribunal de Contas do Estado (TCE) e Assembleia Legislativa, juntam-se os empresários de ônibus. Há possibilidade agora de se completar o mapeamento da corrupção fluminense, para se saber o tamanho exato dessa teia.


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